O início da tradição de enfeitar as ruas de Castelo nasceu como quem semeia fé com as próprias mãos. Era 1963 quando a Irmã Vicência — batizada Zuleide Pereira da Silva — guiada talvez por um sopro divino ou simplesmente pela intuição, espalhou folhas de manga picadas em frente à capela Nossa Senhora das Graças, a capelinha da Santa Casa de Misericórdia castelense.
Não havia formas nem flores, apenas o desejo de honrar o Corpo de Cristo com aquilo que tinha: o verde ofertado pela terra e a ternura do gesto. A cidade já conhecia a prática de cobrir as ruas com folhas de mangueira para a procissão, mas foi ali, diante da capelinha, que essa prática que une arte, fé e tradição começou.
Aquela ação singela germinaria nos anos seguintes em uma explosão de cores, formas e devoção que transformariam a Festa de Corpus Christi de Castelo em uma das maiores do mundo. Pouco tempo depois os tapetes começaram a tomar formas mais elaboradas — folhas organizadas em desenhos, flores colhidas no campo, terras de tons diversos. Mas o que verdadeiramente transformou o sonho em arte foi uma imagem vinda de longe.
Tetê Travaglia, uma das jovens voluntárias que fazia parte do grupo das Luísas de Marilac — meninas e mulheres que viviam a caridade sob a orientação firme e afetuosa da Irmã Vicência — esteve no Rio de Janeiro e trouxe uma publicação e muito entusiasmo.
Tetê viu a capa da lendária Revista O Cruzeiro e deparou-se com a foto de lindos tapetes de Corpus Christi de Matão, cidade do interior de São Paulo. Ficou encantada. No retorno a Castelo chegou não apenas com uma imagem, mas uma semente, uma centelha, do que viria a ser a Festa de Corpus Christi de Castelo, que está entre os 10 maiores eventos religiosos do Brasil.
A tradição que fez história
Nas mãos das Luísas e dos fieis castelenses, essa centelha virou chama, essa semente deu lindos frutos e a ideia de produzir tapetes mais elaborados foi adotada. Quem conta essa história suspirando de saudades é a professora Cecília Perim, uma das Luísas de Marilac, que revela detalhes do início dessa tradição sexagenária.
“Tudo começou muito pequeno, na frente da capelinha. Depois a Irmã Vicência foi estendendo o trajeto, até alcançar o que é hoje. Era uma emoção muito grande. Cada um ficava responsável por enfeitar a frente da sua casa e nós íamos para o interior buscar cravo de defunto, crista de galo e o cipreste, que tinham cheiros muito agradáveis”, relembra saudosa.
Cecília conta que para fazer as formas após a decisão de seguir o modelo mostrado na capa da revista, o ferreiro Tonico Santolin e outros profissionais castelenses criaram moldes de madeira muito simples, geométricos, sem detalhes, para dar contornos ao sonho coletivo de fazer uma festa mais bonita.
Flores eram colhidas nos quintais e nas propriedades de amigos e familiares no interior, pedras eram quebradas com martelos e marretas e os voluntários que tinham parentes em outros municípios pediam que enviassem flores para oferecer tapetes multicoloridos ao visitantes e moradores. A partir daí as ruas se tornaram telas, e os fiéis — artistas.
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